GENTE FEIA


Eu nunca gostei de gente feia. Sim, apesar de eu também ser muito feio. Minha família toda era feia. Meus pais. Meus irmãos. Minha esposa. O mais feio de todos era o meu filho. Certa feita ele me pediu para ir a uma festinha da escola onde estariam todos os pais dos alunos. Embebedei-me antes de ir para enfrentar a situação constrangedora de maneira menos dolorosa. A professora apareceu e me recepcionou sorridente.

- Oi, Sr. Melo, fique à vontade. É muito bom recebê-lo. O  Júnior estava muito ansioso por hoje, não parava de falar no senhor. É uma graça ele.

E ficou com aquela conversa típica de quem, no fundo, não vê a hora de se livrar da gente, mas tentam demonstrar o contrário. 

Nesse tempo o feioso do meu filho foi se misturar com seus colegas. Dezenas de garotinhas ficavam a sua volta querendo tirar fotos com ele e o abraçavam sorridentes. A professora percebeu meu espanto.

- Ah, as meninas  adoram o Júnior. Falam que vão se casar com ele! Imagina? Nessas idades. Essas crianças são fora de série. Não é pra menos, seu filho é lindo mesmo... Puxou ao pai.

Apesar de bêbado, confesso que fiquei um pouco envergonhado com aquilo. Não parecia um deboche. Então ela me chamou até sua sala. Fui logo atrás seguindo seu rebolado que expressava o tema do nosso assunto.

Ela deitou-se sobre sua mesa com o vestido levantado me encarando e disse que a festa foi só um pretexto para me ver. Disse que tinha uma tara por pais de alunos, mas desde que começou a trabalhar naquela escola só via gente feia, exceto eu.

Após ter lavado minha alma e inflado meu ego, chamei o Júnior para irmos embora. Ele demorou um tempo para se livrar do assédio das coleguinhas e veio correndo. Era mesmo bonitão o meu garoto.

- Já vamos, papai?

Expliquei que não gostava que ele ficasse andando com aquela gente feia.

Nenhum comentário: