A CONSULTA



Todos insistiam que eu fosse ao psiquiatra. Lá eu resolveria de vez o que diziam ser o meu “baixo astral contagioso”. Porém, já havia decidido que não iria pagar um monte de grana para ficar falando coisas que me incomodavam a um estranho. Era coisa de louco e eu não era louco.

O negócio é que uma amiga disse que conhecia uma doutora que cobrava muito pouco e era uma profissional reconhecida. Fui.

Eu sempre imaginei que as psiquiatras fossem todas mulheres acima do peso com óculos de armação grossa que no fundo tinham mais neuroses que os próprios pacientes.

Apareceu uma ruiva de um metro e oitenta, talvez. Do tipo que frequenta academia três vezes por semana. Olhos gigantes que pareciam realmente observarem no fundo de nossas almas. Certo que ela lia meus pensamentos. Usava uma saia quase um palmo acima do joelho. Eu estava em sua frente e cada vez que ela descruzava e cruzava as pernas eu baixava os olhos para aquele par de joelhos.

- Em que está pensando? – perguntou.

- Em nada.

- Sempre há algo em que pensamos.

Começou com aquele papinho da profissional que saca de tudo porque estudou anos para isso. 

- Bem, mas eu não estou.

Ela descruzou as pernas.

- E agora?

A saia havia subido a mais de dois palmos.

- Em nada. Já falei.

Encarei aqueles olhos gigantescos com a confiança de um palestrante.

Ela levantou-se. Trancou a porta e tirou uma garrafa de whisky e copos de um armário cheio de medicamentos.

Serviu as doses e sentou-se novamente me encarando. Fiz o mesmo. Ficamos assim por algum tempo.

Do nada ela começou a chorar incontrolavelmente. Fiquei assustado e disse para se acalmar. Abri o armário para ver se havia algum remédio para ajudar, mas eu não conhecia nada. Servi mais bebida e dei a ela. Ela bebeu de um gole só. Respirou fundo e começou a pedir desculpas pelo seu comportamento. Revelou sofrer muito com isso e ficou explicando seus problemas até o final do que era para ser a minha consulta.

Por algum motivo sai dali me sentindo melhor. Talvez fosse algum sentimento obscuro de superioridade frente a fraqueza alheia. De qualquer forma marquei minha próxima visita para dar segmento ao meu novo tratamento.


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